Disciplina - Geografia

Geografia

01/01/1970

COP, mas com pouca cooperação

Cúpula em Cancún herda o fracasso do encontro de Copenhague e pode marcar a falência dos acordos ambientais, uma vez que o Protocolo de Kyoto expirará em dois anos.
Políticos, enviados e cientistas de todo o mundo estão reunidos desde o dia 29 de novembro em Cancún, no México, para uma nova rodada de diálogo patrocinada pela ONU sobre as mudanças climáticas. O encontro, chamado de “COP16” – uma referência à cúpula anterior em Copenhague, a COP15 – vai até o dia 10 de dezembro. A tomar como referência o fracasso da reunião anterior, é muito difícil imaginar que um acordo sobre redução das emissões de gases estufa seja alcançado desta vez.
Há esperanças de acordos mais modestos, como no financiamento dos esforços para reduzir o desmatamento ou para ajudar os países em desenvolvimento se adaptarem às mudanças climáticas. Mas sem significativos ganhos na política, a credibilidade do processo conduzido pela ONU é suscetível a sofrer ainda mais. Enquanto isso, as divisões entre países desenvolvidos e em desenvolvimento continuam intratáveis.
Como na cúpula do ano passado, as negociações na COP16 inevitavelmente envolvem um compensação entre ambição e realismo. A cúpula de Cancún é chamada COP16 por ser a 16a “Conferência das Partes” anual para o Quadro da ONU sobre Convenção sobre Mudança do Clima. Apesar de não ter acontecido como previsto, a cúpula do ano passado tinha como ambição forjar um tratado sucessor ao Protocolo de Kyoto. Em um esforço para gerar o elevado nível de compromisso político necessário para gerar cortes radicais de emissões, a cúpula criou um senso de urgência ao se apresentar para o mundo como a última boa chance de criar um acordo global sobre as emissões. Esta foi uma tática compreensível e necessária, mas também, sem dúvida, saiu pela culatra em termos de credibilidade política quando a COP15 não atingiu o seu nobre objetivo (na verdade, estava claro que bem antes da cúpula que um sucessor de Kyoto não seria assinado).
Este ano a história é diferente. O risco da COP16 não é de apresentar promessas acima da realidade e de alcançar resultados insatisfatórios, já que as expectativas já são muito baixas, mas de que a cúpula de modestas ambições enfraqueça o ímpeto por trás dos esforços globais para combater as alterações climáticas. Isso pode gerar um sentimento de resignação prejudicial à continuação de iniciativas políticas em muitos países. No entanto, a maioria dos observadores são suscetíveis a valorizar o processo em si mesmo, o que poderia mover a mudança climática ainda mais para baixo na agenda política. Na verdade, ao invés de focar no sucesso ou fracasso da COP16 como um evento pontual, é mais realista considerá-la como parte de um processo contínuo, parecido com a Rodada de Doha nas negociações comerciais que fluíam ao longo de anos ao abrigo dos auspícios da Organização Mundial do Comércio.
A maioria das metas da COP15 não será alcançada na COP16. A cúpula do último ano não só não conseguiu produzir metas para o corte de emissões, como também não propôs nenhuma previsão de data para um pico global de emissões. O Acordo de Copenhague reconheceu, embora não por unanimidade, que o aumento médio da temperatura global deve ser limitado a 2o C acima dos níveis pré-industriais. Ele também se comprometeu a transferir cerca de 30 bilhões de dólares dos países ricos aos em desenvolvimento entre 2010-12 para ajudar a financiar medidas de adaptação às alterações climáticas ou para “diminuir” o aumento de emissões, com ênfase na luta contra o desmatamento. Também fixou o objetivo de aumentar este montante para 100 bilhões de dólares por ano a partir de 2020. O Acordo também prevê uma revisão dos progressos até 2015, incluindo a consideração de se abaixar a meta para o aumento médio da temperatura global a um ambicioso 1.5o C acima dos níveis pré-industriais.
Parece que a cúpula deste ano se concentrará em incrementar o progresso até agora conquistado, particularmente em relação à proposta de criar mecanismos para a concessão de financiamento aos países pobres. As adaptações às mudanças do clima podem ser controversas devido as preocupações de que sua promoção enfraquece a vontade política de combater as emissões. Medidas específicas de diminuição por cada país são menos controversas, salvo em que possam refletir uma falta de consenso global. Mas agora parece haver uma maior percepção de que um grande acordo sobre as emissões está cada vez mais distante e não há outra alternativa senão galgar os objetivos mais palpáveis. Em particular, há um certo otimismo de que os participantes da cúpula possam acordar mais detalhes para a execução do programa de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD). Isso implicaria esforços para estabelecer e difundir o uso de recursos financeiros baseados no mercado para evitar o desmatamento, especialmente nos países em desenvolvimento.
Divisão Fundamental
Não importa qualquer acordo que aconteça em Cancún, o esforço para ampliar o combate às alterações climáticas passará a enfrentar maiores dificuldades. A cerne do problema continua a ser a divisão entre os países ricos e os em desenvolvimento. O mundo rico é historicamente apontado como o culpado pelo aquecimento global e, portanto, seria natural os países desenvolvidos contribuírem mais para combater o problema. Certamente, os países em desenvolvimento são resistentes às metas obrigatórias de emissões, argumentando que isso injustamente brecaria o seu desenvolvimento econômico e que restrições similares não estavam em vigor quando, o que são hoje os países ricos, estavam no mesmo estágio de desenvolvimento. No entanto, países como a China estão cada vez mais contribuindo para as emissões de carbono, logo qualquer pacto global para lidar com as emissões a partir do desenvolvimento do mundo seria ineficaz. Embora a China seja a líder entre os países em desenvolvimento em investimentos em tecnologia de energia limpa – em parte por razões estratégicas – é também uma grande poluidora. Além disso, está construindo mais usinas termoelétricas de carvão como parte de uma campanha para ampliar a capacidade elétrica do país.
A questão se a China pode, um dia, ser persuadida a aceitar limites impostos externamente sobre as suas emissões, está em aberto. O que é certo é que os países em desenvolvimento não farão nenhum pacto sem que os governos ricos também façam maiores compromissos em relação aos que têm feito atualmente. O isolamento dos EUA neste ponto se mantém particularmente problemático. Seus políticos se recusaram a ratificar o Protocolo de Kyoto em 1997. A recente vitória do Partido Republicano nas eleições legislativas significa que o Congresso, em 2011, será ainda mais resistente à proposta de incentivos comerciais àqueles que poluírem menos. O aumento de impostos sobre a gasolina, muitas vezes considerada pelos economistas como uma forma simples e eficaz de reduzir as emissões dos EUA, também seria politicamente inviável.
Para as economias dos países ricos, os problemas fiscais e as preocupações com uma fraca recuperação econômica podem limitar, a curto prazo, o apetite pela regulamentação ambiental, que poderiam impor mais custos para as empresas e governos e levar a perdas de emprego em indústrias poluentes. Embora o principal impulso na política de redução de emissões ter sido promovido pelo setor privado, as sequelas da crise financeira mundial também pode travar o progresso nesta área por fazerem os financiamentos ficarem mais caros e menos prontamente disponíveis.
Tudo isso deixa os esforços para combater as alterações climáticas em uma lamentável posição. Os legisladores até já admitem que limitar o aumento nas temperaturas globais para 2o C acima dos níveis pré-industriais será praticamente impossível de alcançar. Quanto mais as negociações perdem credibilidade pela incapacidade de produzir um acordo substantivo, mais difícil será para os políticos em muitos países conseguirem ganhar apoio doméstico para os cortes de emissões. Investimento em tecnologia de baixas emissões poderia sofrer um impacto por causa da incerteza política. Enquanto isso, os compromissos do Protocolo de Kyoto expirarão ao final de 2012. A menos que a “COP” logo se transforme em “cooperação”, a perspectiva de um novo tratado ou a extensão dos compromissos de Kyoto parece fraca.

Esta notícia foi publicada em 10/12/2010 do Carta Capital. Todas as informações nela contida são de responsabilidade do autor.
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